quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Os solavancos de um país chamado Brasil

O mar de lama da corrupção demonstrada pela operação lava jato e a apropriação indébita de recursos públicos ao privado na gestão pública, impressionam e nos causam ansiedade e angústia. Desse modo o sentimento de impunidade preocupa e nos coloca diante de um dilema patético de realmente passar o país a limpo ou de sucumbirmos com ele.
Dentro de uma crise sem precedentes e que se agrava com as incertezas vindas da eleição de “Donald Trump” nos Estados Unidos, o atual ambiente econômico e político do país nos revela a necessidade de realizar duas operações cirúrgicas, ao mesmo tempo, uma a de salvar o país da corruptela, e outra, a de refazer os desmandos na economia, saneando os gastos públicos, colocando a casa em ordem para trazer de volta o respeito e a seriedade com o trato das coisas públicas.  
Assim, diante de tantos solavancos é a vez do Banco do Brasil espelhar suas dificuldades com o fechamento de agências e convocando seu corpo de funcionários a aderirem a seus planos de desligamento voluntário, fazendo assim o dever de casa deixado de lado por longos anos. Para termos uma ideia desse quadro, o setor privado já vinha, há algum tempo, enxugando suas estruturas com fechando agência e focando em agências digitais enquanto o Banco do Brasil e a Caixa Econômica desavisadamente vinham abrindo agências e aumento o quadro de funcionários.
Como diria Mário Quintana: “nesses tempos bicudos”, você liga o rádio ou a TV, conecta-se à internet ou abre os jornais angustiando em receber notícias dignas e virtuosas, mas somente vê propaganda subliminar, suja e corrupta. E completa dizendo: o deplorável é que a grande maioria das pessoas sequer sabe entender, interpretar, quanto mais projetar a informação no seu hoje e no seu amanhã.
Diante do descalabro de hoje cabe ainda lembrar o Padre Antônio Vieira em seu célebre Sermão do Bom Ladrão escrito em 1655, proferido da Igreja da Misericórdia de Lisboa em Portugal. Presentes o Rei Dom João IV e sua corte, os maiores dignitários do reino, juízes, ministros e conselheiros.
Em seu sermão o Padre Viera ataca e critica aqueles que se valiam da máquina pública para enriquecer ilicitamente, denuncia os escândalos no governo, riquezas ilícitas, venalidades de gestões fraudulentas e, indignado, condena a desproporcionalidade das punições, com a exceção óbvia dos mandatários do século 17.
Dessa maneira o Padre Vieira usou o púlpito como arauto das aspirações públicas, à guisa de uma imprensa ou de uma tribuna política. Embora estivesse na Igreja da Misericórdia, disse ser a Capela Real e não aquela Igreja o local que mais se ajustava a seu discurso, porque iria falar de assuntos pertinentes à sua Majestade e não à piedade.
De início, o padre adverte aos reis quanto ao pecado da corrupção passiva e ativa, pela cumplicidade do silêncio permissivo, e assim, o sermão apresenta uma visão crítica sobre o comportamento imoral da nobreza, da época.
Em um dos fragmentos do Sermão o Padre Vieira diz: Levarem os reis consigo ao paraíso os ladrões, não só não é companhia indecente, mas ação tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. Mas, o que vemos praticar em todos os reinos do mundo é, em vez de os reis levarem consigo os ladrões ao paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno. Assim, a salvação não pode entrar sem se perdoar o pecado, e o pecado não se perdoa sem se restituir o roubado. Porquanto os seus príncipes, ao invés de tomar conta do povo como os pastores, roubam o povo como lobos.
Em outro momento Padre Vieira narra uma passagem histórica com Alexandre Magno (grande conquistador do mundo antigo), e disse: navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo mar Eritreu a conquistar a Índia; e como fosse trazido à sua presença um pirata, que por ali andava roubando os pescadores, repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício: porém o pirata, que não era medroso nem lerdo, respondeu assim: Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador? Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza: o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito poder faz os Alexandres.
Assim, muitos cuidam de sua reputação, porém, não de suas consciências.

2 comentários:

  1. Estamos vivendo momentos onde a seleção natural de pessoas de bem, independente do nosso querer irá acontecer. Todo os corruptos e corruptores estão sendo desmascarados. Instituições a princípio consideradas sérias, estão mostrando agora como conseguiam auferir recursos tão expressivos, com a ajuda do poder público (classe política). A seleção natural esta ocorrendo e quem não se comprometer com a ética e com a honestidade será convidado a prestar contas dos seus atos. O Brasil esta sendo preparado para ser o coração do mundo, disso não tenho dúvidas.

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  2. Gostei muito do texto e de tuas incursões literárias e históricas, Sérgio. Muito oportuna a opinião visionária do Nilton Diniz, com o qual concordo igualmente em minha percepção quanto ao "preparo" da sociedade brasileira para a sua vocação maior e definitiva. Remete-me, também, ao que lemos na Bíblia Cristã, em relação às maldades e roubos, neste final dos tempos, nos sentido de que "nada oculto deixará de ser revelado"...

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