quarta-feira, 3 de abril de 2019

Os Militares e a Reforma da Previdência


O sistema previdenciário brasileiro está defasado e obsoleto, todos sabemos. Ele tem apenas gerado distorções que promovem desigualdades, as quais os pobres vêm financiando as aposentadorias dos mais ricos. E com os militares brasileiros não é diferente, as distorções também acontecem.
Fazendo uma analogia com o sistema de aposentadoria dos militares brasileiros com as aposentadorias dos militares de países como os Estados Unidos, Grã Bretanha, Portugal e outros, percebemos claramente essas distorções.
Assim, no Brasil, os militares recebem o benefício integral após 30 anos de serviços prestados, além de gratificações que podem até dobrar os vencimentos.
Nos EUA e no Reino Unido a aposentadoria integral para os militares acontece, somente, em casos de invalidez ou morte do oficial em serviço.
Um detalhe, nos Estados Unidos, os militares, podem se aposentar após 20 anos de serviço, porém proporcionalmente ao tempo de serviço prestado. Os militares da ativa dos EUA se aposentam sem idade mínima e a base de cálculo é a média dos últimos 36 salários recebidos. Após 30 anos de serviço, o benefício pago ao militar vai representar 60% da remuneração mais uma parcela de contribuição complementar. Por lá, a média de idade de um soldado não incapacitado, na ativa, é de 42 anos.
Já no sistema britânico, apesar de a base de cálculo ser o soldo integral, como no Brasil, há uma idade mínima de 60 anos para a aposentadoria. Após 30 anos de serviço, o benefício será de 63,8% do salário mais uma parcela complementar contributiva.
O fato de os militares brasileiros terem seus benefícios integrais assegurados já os coloca em vantagem em relação a americanos e britânicos, avaliam especialistas.
Na realidade algumas regras referentes à reserva e à reforma de militares são diferentes das regras de aposentadoria para as demais profissões, dado o impedimento a greve para os militares, e ao risco das atividades que executam. Algumas diferenças são aceitáveis, porém, as regras que temos hoje como aposentadoria integral, dentre outras, já não fazem mais sentido. Além disso, o benefício dos militares é custeado, quase que integralmente pelo governo, ou seja sem uma contribuição do militar. 
Segundo dados do TCU as aposentadorias de militares e servidores vão gerar um déficit de R$ 90 bi em 2019.
Na chamada Previdência Social, para trabalhadores do setor privado, o teto atual para a aposentadoria é de R$ 5.645. Já um militar que vai para a reserva não possui um limite máximo para os valores recebidos. Em tese ele está sujeito ao teto constitucional, equivalente ao salário de Ministros do STF, de R$ 39,3 mil, atualmente.
A lógica por trás dessas discrepâncias é a de que a carreira militar requer condições especiais, já que, entre outras peculiaridades, a categoria não tem direito a greve, a horas extras e não recolhem FGTS; além de não terem direito a adicionais noturnos e de periculosidade. Obviamente há diferenças. É uma carreira com muitas especificidades, com mais riscos que as demais, e caso a pessoa deixe o serviço militar, as condições são difíceis.
No entanto, os benefícios para os militares aposentados no Brasil acabam ultrapassando os concedidos em outros países, como o Reino Unido, Estados Unidos, e outros.
Em 2017, o déficit dos gastos com militares inativos e pensões do Exército, da Marinha e da Aeronáutica chegaram a R$ 37,7 bilhões. O déficit previsto para 2019 está em R$ 43,3 bilhões, de acordo com dados da proposta orçamentária para este ano. Esse valor é 47,7% dos R$ 90 bilhões de déficit previdenciário do setor público; enquanto os valores gastos com os militares inativos chegam a R$ 24,5 bilhões.
Relatório do TCU (Tribunal de Contas da União), de 2017, afirma que mais da metade (55%) dos membros das Forças Armadas no Brasil se aposentam entre os 45 e os 50 anos de idade.
No Reino Unido, a idade mínima para aposentadoria é de 65 anos. Nos EUA não há idade mínima, é proporcional ao tempo de serviço, e os militares têm incentivos para continuar mais tempo na ativa.
Os militares também são afetados pela questão demográfica que se usa para justificar as reformas na previdência da iniciativa privada. Ou seja, o envelhecimento da população e o fato das pessoas estarem envelhecendo com mais saúde também reflete nos militares da reserva.
Outra questão a ser observada é que os militares brasileiros na ativa não contribuem para suas aposentadorias, embora, contribuam para pensões, as quais se dirigem aos dependentes em caso de infortúnios.
O que está relacionado à saída dos militares da ativa. Ou seja, eles na realidade não se aposentam, passam para a reserva e, a partir de certa idade, são reformados.
Daí, o que o militar recebe não é entendido como um benefício previdenciário, é entendido como um salário.
Assim, os militares também não estão vinculados à Previdência Social, o que se chama de RGPS (Regime Geral de Previdência Social), e nem ao sistema previdenciário próprio dos funcionários públicos, o RPPS (Regime Próprio de Previdência Social). Na prática, o que acontece é que toda a sociedade está pagando pela aposentadoria dos militares; o que, segundo especialistas, não é uma alocação adequada de recursos.  
A única contribuição realizada pelos militares vão para as pensões que, atualmente, é de 7,5%, a qual com a reforma, pode subir para 9% caso o militar tenha ingressado na carreira antes de 2001; contra uma contribuição de 11% do salário bruto de um civil ao INSS.
Registros apontam que o Exército brasileiro tinha, no início do ano passado, mais de 67.600 filhas de militares recebendo R$ 407 milhões mensais, o que corresponde a mais de R$ 5 bilhões anuais. No entanto, as contribuições para pensões realizadas pelos militares não é suficiente para cobrir todas as despesas com as pensões. A previsão de gastos com pensões militares em 2019 deve chegar R$ 21,2 bilhões. Desse valor, R$ 3,2 bilhões serão cobertos pelas contribuições dos militares, restando um déficit de R$ 18 bilhões.
Por outro lado, as mudanças realizadas no ano 2000 não alterou as outras possibilidades de pensão. Assim, as viúvas e viúvos de militares continuam recebendo pensão integral, assim como dependentes de até 21 anos. Este é mais um dos pontos a serem revistos.
Já nos Estados Unidos, viúvas, viúvos e filhos menores de 18 anos recebem pensão de 55% do valor do salário dos militares.
E no Reino Unido, viúvas e viúvos recebem 62% do valor do salário, valor que vai caindo progressivamente se o cônjuge for mais novo do que o militar em 12 anos ou mais. A ideia desse modelo é evitar fraudes e casamentos arranjados, pois se tiverem filhos, o valor sobe.
As regras atuais brasileiras permitem que os militares se aposentem com salário integral após 30 anos de serviços prestados (se homens) ou de 25 anos (se mulheres). Comparativamente, com o mesmo tempo de serviço, os EUA dão aos seus militares 60% do salário. E sob as mesmas condições, os militares do Reino Unido recebem 43% do salário integral e os de Portugal recebem 83%. Nessas três nações, o benefício é concedido da mesma forma para militares homens e mulheres.
Dados indicam que no Brasil, se um militar ingressar na carreira aos 17 anos, ele irá para a reserva com salário integral aos 47 anos. Já nos EUA, é possível a um militar se aposentar mais cedo, aos 37 anos, porém, o valor da remuneração nesse caso, cai para 40% do salário.
Importante salientar que, de tempos em tempos, os países mundo afora, fazem reformas em suas Previdências, para equilibrar não somente as questões demográficas, mas também os desajustes provocados com o tempo. O que não deixa de ser uma questão conceitual, pois, todos os países estão envelhecendo e isso nos obriga a uma preparação e exige um esforço maior de custeio de toda sociedade, incluindo os militares.
Nesse sentido, a Reforma da Previdência brasileira é bem-vinda, desde que elimine os privilégios, pois é preciso lembrar que todos os privilégios viram impostos. E os impostos recaem sobre a sociedade como um todo. Portanto, a necessidade de se levar em consideração as especificidades do serviço militar não podem levar à justificativa de privilégios.
Para termos uma ideia, o Reino Unido realizou uma reforma no sistema previdenciário dos militares em 2013 e os Estados Unidos realizou uma reforma em 2015. Ou seja, ambos os países se adequando às novas realidades demográficas e orçamentárias de suas nações.
Assim, podemos concluir que as regras previdenciárias brasileiras para os militares são mais generosas do que as normas impostas a países ricos, o que, realmente se torna um contrassenso.

4 comentários:

  1. Mais uma vez Sérgio, parabéns pelo seu artigo! Como sempre,focado em assuntos que ajudam muito na reflexão e o interesse á soberania de nossa Nação Brasileira.
    Gostei muito e essa frase, temos que insistir e acabar com ela:"Todo privilégio viram Impostos e os impostos, recaem sobre a Sociedade como um todo"! É isso aí Sérgio, que vc continue esse seu trabalho maravilhoso! Deus te abençoe e te proteja! Abraço meu amigo! Parabéns!

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  2. Prezado Sérgio. Parabéns pelo seu meritório artigo. Retrata, com amplitude e clareza, um dos mais importantes temas em discussão no Congresso Nacional, de interesse de todo povo brasileiro.
    Gostaria, nesse contexto, de sua preciosa analise também sobre os gritantes privilégios concedidos aos membros do Poder Judiciário, considerando que todos privilégios viram impostos; por se tratar de um fato tão contestado na mídia e ignorado pelos congressistas, criando a impressão de que a exigência imposta para reforma da previdência com inclusão dos militares seja fruto de retaliações de esquerda.
    Forte abraço.

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  3. Ah! Insuportável também os astronômicos privilégios concedidos à classe política brasileira. Haja impostos!

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  4. Parabéns meu amigo. Mas uma vez um artigo muito esclarecedor. Grande abraço.

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